quinta-feira, 11 de agosto de 2011

Melancolia

Contigo o Inverno foi ameno.
como o som da tua voz macia, serena,
como estrelas caindo sobre o feno.
como os pedaços de luz e fantasia que me servias ao pequeno-almoço

Às vezes quando falo sozinho e é a tua voz que ouço:
palavras envoltas no pano de linho que deixaste esquecido
na gaveta do fundo.
Restos de um sonho do tamanho do mundo
e de um grão de areia.

No silêncio da casa ainda vagueia
o cheiro doce das  rosas brancas
que nos olhos trazias
E, às vezes, na penumbra das manhãs mais frias
ouve-se o eco do teu riso de pétalas breves
alegre e trepidante como um guiso às voltas numas mãozitas de criança
e irrequieto como elas.
- Ou é o vento que dança no telhado, assobiando entre as frinchas da janela?

terça-feira, 26 de julho de 2011

Estrela cadente



Perdi de novo. Que importa?
Há muito que o sonho estava perdido, esbatido, desfeito…
Nada me dói - nem a esperança nem a saudade.
Vou à janela. A noite, nua e crua, estende-se diante de mim.
Límpida. Serena. Muda.
O céu estrelado não mudou de sítio.
E vem aí o tempo das Perseidas… 


sábado, 14 de maio de 2011

Basta

Chega de resmungos indiscretos
Solilóquios secretos de alquimia
Sorrisos e pulsões a conta-gotas
Carregados de mágoa e de ironia

Chega de monólogos sem remate
de frases repetidas e estéreis
retumbantes de arrojo e de vazio
na árida penumbra do meu quarto

Basta!

Quero a luz do sol inteira nos meus olhos
imensa e pura plena de sentido
Quero a frescura intensa de um beijo 
alongada entre o desejo e um sorriso

Quero o roçagar firme de um peito
suculento e palpitante em meus abraços
Quero mãos de afagos atrevidos
arfantes de prazer e de cansaço

Quero rebentos tenros de palmeira
marejando os lábios ressequidos
E água, água da nascente mais secreta
ao encontro da sede dos sentidos

Quero despertares amanhecidos
por ânsias doidas e gestos cristalinos
Quero palavras lentas murmuradas
ao ouvido em sons de violinos

Quero verdes fortes, matas densas
ocultos prados cravados na lonjura
Quero lágrimas de espera, abraços lentos
revelados em fios de ternura

Quero o mar o céu o infinito
A ambição levada ao absurdo
-ou apenas o rubor de uma face
em que o brilho nos olhos diga tudo

Na morte de um velho

Les vieux ne bougent plus, leurs gestes ont trop de rides, leur monde est trop petit
Du lit à la fenêtre, puis du lit au fauteuil et puis du lit au lit
Et s’ils sortent encore bras dessus, bras dessous, tout habillés de raide
C’est pour suivre au soleil l’enterrement d’un plus vieux, l’enterrement d’une plus laide
Et le temps d’un sanglot, oublier toute une heure la pendule d’argent
Qui ronronne au salon, qui dit oui qui dit non, et puis qui les attend
Les vieux ne meurent pas, ils s’endorment un jour et dorment trop longtemps
Ils se tiennent la main, ils ont peur de se perdre et se perdent pourtant
Vous le verrez peut-être, vous la verrez parfois en pluie et en chagrin
Traverser le présent en s’excusant déjà de n’être pas plus loin
Et fuir devant vous une dernière fois la pendule d’argent
Qui ronronne au salon, qui dit oui qui dit non, qui leur dit : je t’attends
Qui ronronne au salon, qui dit oui qui dit non et puis qui nous attend.